SP tem 16 pessoas presas pelo crime de aborto
Profissionais da saúde são responsáveis pela maior parte das denúncias sobre a prática
O Estado de São Paulo tem 16 pessoas presas pela prática do crime de aborto, de acordo com a Secretaria de Administração Penitenciária. Entre elas estão três mulheres e 13 homens. Porém, o número de inquéritos abertos se “perde” no sistema judiciário, encobrindo atentados aos Direitos Humanos, quebra de sigilo médico-paciente e notificações falsas de crime, que ficam à margem das discussões e dos olhos da sociedade.
O levantamento mais recente sobre o número de inquéritos no Estado aponta que há 111 investigações abertas, entre janeiro e outubro de 2014. A pesquisa foi feita de forma artesanal em fóruns e delegacias pela Defensoria Pública de São Paulo com a ajuda do Cladem (Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher). A obscuridade com que o assunto é tratado influencia diretamente nesses números, que, segundo os órgãos envolvidos na pesquisa, podem não refletir a magnitude dessa realidade.
Entretanto, o que chama a atenção dos pesquisadores nos casos levantados é a quantidade de inquéritos que foram abertos após a denúncia partir de um profissional de saúde. Para Ana Rita Souza Prata, coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública de SP, essas denúncias chegam fundamentadas de forma ilegal, por causa de quebra de sigilo médico-paciente, fazendo com que a materialidade da prova seja o relato na mulher que fez o aborto.
— O autoaborto permite a suspensão condicional do processo. É um benefício para penas mais baixas, que faz com que a pessoa cumpra condições, como cursos, apresentação ao juiz e prestação de serviços para que o processo seja extinto. A maioria dessas mulheres não tem antecedentes ou impeditivos legais para receber o benefício, então elas aceitam, para não correr o risco de serem condenadas criminalmente. Com isso, algumas teses de defesa importantes não são levadas ao judiciário, como a ilegalidade da denúncia, no caso das feitas por agentes de saúde. Como o caso não avança, essa discussão não é feita e os profissionais de saúde saem ilesos da irresponsabilidade.
A coordenadora alerta que essa prática dos profissionais de saúde pode resultar na abertura processos injustos.
— Acredito que há muito caso de aborto espontâneo sendo apontado como proposital, uma vez que muitas mulheres que chegam no hospital nessa condição relatam que o aborto foi provado com o uso de chá de carqueja, por exemplo. Mas muitas dessas causas apontadas não têm embasamento científico nenhum, mas, mesmo assim, o agente de saúde faz a denúncia e a mulher passa a ser investigada por um crime que não cometeu.
A advogada e coordenadora nacional do Cladem Gabriela Cunha Ferraz acredita que uma mulher estar presa ou responder a um inquérito pela prática de aborto é um “absurdo” e afirma que a descriminalização é a única forma de desenvolver a problemática e mapear os casos e abusos que envolvem o processo.
— A vida dessa mulher não vale nada, não importa se ela esteja morta ou presa. Esse tabu faz com que os casos sejam subnotificados. É um País sem dados, um País que não sabe a quantidade de violações cometidas contra suas mulheres.
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