Nova lei eleitoral é 'experimento', dizem especialistas
A eleição de 2016 será um "experimento", afirmam especialistas em legislação eleitoral à Folha.Mudanças na lei que rege a disputa, mais restritiva em diversos aspectos, trazem incerteza sobre efeitos colaterais e efetividade no combate à corrupção.
A principal delas é a proibição de doação de pessoas jurídicas –até 2014, as grandes financiadoras das campanhas. Os então candidatos Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), por exemplo, receberam, juntos, quase R$ 100 milhões de empreiteiras hoje investigadas na Lava Jato.
"Essa é a principal mudança, e está sendo encarada como experimento para 2018. Será que nós vamos conseguir mudar um sistema que dependia basicamente do financiamento empresarial?", diz o cientista político e professor da UFRJ Jairo Nicolau.
Uma das saídas que vêm sendo aventadas para a escassez de recursos que o fim da contribuição empresarial deve causar é o aumento do papel do Fundo Partidário.
Quase triplicado em 2015, de R$ 372 milhões para R$ 867,6 milhões, o fundo é previsto no Orçamento e constitui uma das principais fontes de recursos dos partidos. O Orçamento de 2016 destina R$ 819,1 milhões às siglas.
"Você só tem três alternativas: Fundo Partidário, recursos próprios ou doação de pessoa física, então deve depender muito dele", diz o cientista político Fernando Azevedo, da Universidade Federal de São Carlos.
Segundo ele, porém, o montante que será reservado aos candidatos depende da estratégia partidária, que pode optar por guardar recursos para outras campanhas, como a eleição presidencial de 2018. "Como o fundo tem um teto também, você tem que escolher uma campanha para priorizar."
O procurador regional eleitoral em São Paulo, Luiz Carlos Gonçalves, discorda. Para ele, apesar de maior, o valor do Fundo Partidário não conseguirá fazer a diferença no vazio deixado pelas empresas. "Os valores foram aumentados, mas não ombreiam as doações empresariais. Além disso, poucos desses recursos chegam aos diretórios municipais."
Para ele, portanto, o que definirá o montante disponível de cada candidato serão os recursos próprios. Os políticos podem investir em si mesmos até o teto permitido –no caso da Prefeitura de São Paulo, R$ 45,4 milhões no primeiro turno.
"Vai ser uma eleição plutocrática [que favorece aos mais ricos]. Se fosse realmente democrático, deveria haver limite para essas doações."
No entanto, o estabelecimento de um teto para os gastos –outra novidade na lei– pode proporcionar maior igualdade de disputa entre os candidatos. "Não porque os menores vão arrecadar mais, mas porque os maiores vão arrecadar menos", afirma Nicolau.
CAIXA DOIS
De acordo com Sídia Lima, ciência política da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e autora do livro "Prestação de Contas e Financiamento de Campanhas Eleitorais", a limitação é benéfica por trazer parâmetros para coibir doações ilícitas. "Antes, não havia maneira de fiscalizar, porque não havia limite."
A pesquisadora acredita que a nova legislação somada ao "efeito Lava Jato" deve fazer o chamado caixa dois diminuir em 2016. "Ninguém imaginava que iria se conseguir de fato descobrir o que foi repassado a quem", diz. "Acho que os políticos vão pensar duas vezes antes de usar doações ilegais."
Já para o professor de ciência política da USP Glauco Peres, sem melhora na fiscalização, não há garantia de que o caixa dois seja reduzido. "O partido acredita que, se tiver mais dinheiro, tem mais chances de vencer as eleições. Então eles vão continuar tentando buscar esse recurso."
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EFEITOS COLATERAIS DA NOVA LEGISLAÇÃOProibição de doações empresariais
Pode incentivar o caixa dois para bancar campanha, já que os partidos passarão a depender só de Fundo Partidário e pessoas físicas
Grandes empresas não poderão fazer contribuições milionárias aos principais partidos, diminuindo a assimetria entre candidatos
Fundo Partidário
Com outras fontes escassas, partidos podem direcionar recursos para candidatos mais competitivos
Teto de gastos
Diminui a necessidade de recursos; divulgação mais barata, via redes sociais e campanha na rua, irá crescer
Propaganda na TV, a parte mais cara da campanha, não poderá ser espetaculosa
Diminuição do tempo de campanha
Com menos tempo disponível para propaganda, candidatos já conhecidos terão vantagem
Candidatos têm menos tempo para oscilar na preferência do eleitor; ascensão e queda devem ser mais bruscas
Horário eleitoral mais curto na TV
Há um incentivo maior para assistir aos programas em vez de trocar de canal
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