quarta-feira, 18 de maio de 2016

Mulheres poderosas da América do Sul estão em apuros. Seria o gênero um fator de influência?

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  • Francesco Desgasperi/AFP
    Em foto de 11 de março de 2014, a presidente do Chile, Michele Bachelet (centro), acena ao lado da então presidente da Argentina, Cristina Kirchner (esq) e da presidente afastada do Brasil, Dilma Rousseff (dir), no palácio de Cerro Castillo, em Viña del Mar, no Chile
    Em foto de 11 de março de 2014, a presidente do Chile, Michele Bachelet (centro), acena ao lado da então presidente da Argentina, Cristina Kirchner (esq) e da presidente afastada do Brasil, Dilma Rousseff (dir), no palácio de Cerro Castillo, em Viña del Mar, no Chile
Na Argentina, a ex-presidente Cristina Kirchner foi indiciada sob a acusação de pôr em perigo as finanças do país. No Brasil, a presidente Dilma Rousseff enfrenta um julgamento de impeachment, e seu sucessor interino só indicou ministros homens. No Chile, a presidente Michelle Bachelet, que já foi extremamente popular, viu seus índices de aprovação despencarem.
O que aconteceu com as mulheres poderosas da América do Sul?
Kirchner foi indiciada na sexta-feira (13) e Rousseff, suspensa pelo Congresso um dia antes, o que potencialmente põe fora de campo duas das mulheres mais influentes da região. Com o governo de Bachelet também profundamente impopular, alguns poderiam ser tentados a indagar se os avanços feitos pelas mulheres podem aparentemente ser revertidos.
"Se nós, mulheres, atirarmos nosso peso em um reino que tem sido exclusivo dos homens, é lógico que essas coisas acontecerão", disse Norma Amorín, 73, uma esteticista aposentada em Buenos Aires.
O destino dessas três líderes hoje contrasta acentuadamente com sua posição cinco anos atrás. Em 2011, Rousseff iniciou sua presidência; Kirchner ganhou um segundo mandato consecutivo; e Bachelet, depois de completar seu primeiro governo com índices de aprovação superiores a 80%, dirigiu um órgão da ONU.
Segundo analistas, o gênero não é a causa dos atuais problemas das líderes. Mas eles acrescentam que o declínio coletivo das três indica uma persistência das atitudes machistas na região, especialmente no meio político.
"Há forças poderosas em jogo que resistem a essas mudanças", disse Sergio Berensztein, um importante comentarista político argentino, referindo-se a como as mulheres ganharam e agora estão perdendo terreno nos corredores do poder na América Latina.
Berensztein disse que a dificuldade das três líderes também deve ser considerada no contexto mais amplo das crises que enfrentam os presidentes --homens e mulheres-- de toda a região. Escândalos de corrupção e o fracasso em aproveitar plenamente as receitas de matérias-primas como petróleo, cobre e soja levaram à insatisfação crescente com os que ocupam o poder.
Enquanto estudiosos de gênero lutam para explicar os fatores por trás da queda de Kirchner e Rousseff, eles também indicam a ascensão de outras mulheres políticas na região.
María Eugenia Vidal foi eleita no ano passado governadora da Província de Buenos Aires, a maior e mais populosa da Argentina. Por algum tempo, Marina Silva esteve na corrida presidencial no Brasil. E no Peru Keiko Fujimori poderá se tornar a presidente nas eleições do próximo mês.
A vitória de Vidal, em particular, foi vista positivamente aqui porque ela não sucedeu meramente a um colega homem popular ou ao marido.
Mas o enfoque da mídia local à sua vida pessoal, incluindo reportagens sobre como ela emagreceu, indicam um progresso vacilante, disse Mariel Fornoni, diretora da Management and Fit, uma consultoria política em Buenos Aires.
Kirchner assumiu a Presidência em 2007 após seu marido, Néstor Kirchner, que morreu em 2010. Muito antes dela, Eva Perón, provavelmente a mulher mais famosa da Argentina, ganhou proeminência nos anos 1940 juntamente com seu marido, o ex-presidente Juan Domingo Perón. Rousseff também foi a sucessora escolhida por um homem, Luiz Inácio Lula da Silva.
Várias autoridades do governo de Kirchner, inclusive seu ex-vice-presidente, Amado Boubou, foram atingidas por casos de corrupção. Mas ela recebeu o grosso da ira pública na sexta-feira, depois que um juiz a indiciou sob acusações relacionadas a um escândalo financeiro que ela nega e um promotor tentou prolongar uma investigação sobre lavagem de dinheiro.
No Brasil, a revolta pública sobre um extenso escândalo de corrupção na companhia nacional de petróleo se avolumou em torno de Rousseff e ajudou a impulsionar o procedimento de impeachment, embora ela não seja citada diretamente na investigação.
No Chile, acusações de corrupção recentes embaraçaram muitos executivos de empresas e políticos, mas um caso envolvendo a nora de Bachelet foi a causa principal da grande queda nos índices de aprovação da presidente.
"É como se as mulheres líderes estivessem recebendo toda a culpa pela corrupção dos homens", disse Farida Jalalzai, professora de política de gêneros na Universidade Estadual de Oklahoma. "Seria surpreendente se não houvesse uma dinâmica de gênero por trás disso."
Apesar de os sistemas de cotas terem reforçado as carreiras políticas de mulheres da região, há uma sensação de que as atitudes tradicionais nunca realmente se atenuaram. A última safra de primeiras-damas, dizem observadores, é de modelos de feminilidade.
No Brasil, o novo presidente, Michel Temer, que indicou um gabinete totalmente sem mulheres, é casado com uma ex-candidata em concurso de beleza.
Juliana Awada, mulher do presidente Mauricio Macri, da Argentina, é uma estilista de moda. E Isabel Macedo, a nova noiva de Juan Manuel Urtubey, um importante governador argentino com ambições presidenciais, foi atriz de telenovelas, assim como Angélica Rivera, a primeira-dama do México.
"É uma manifestação de atitudes machistas residuais", disse Berensztein.
* Colaborou Pascale Bonnefoy, de Santiago (Chile)
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